*Osvaldo Alencar Silva
Empregado é despedido sem justa causa. Alguns dias após o empregador ter apresentado a carta de despedida, descobre que o empregado praticou várias irregularidades.
É possível transformar a despedida sem justa causa em despedida por justa causa? Sim, é possível.
Como se sabe, trabalhador desligado sem justa causa tem direito a ser indenizado pelo empregador. Por outro lado, aquele trabalhador que comete falta grave e é desligado da empresa por justa causa, perde o direito a receber essas verbas indenizatórias (multa de 40% do FGTS, aviso prévio indenizado, férias e 13º salário proporcionais), bem como não saca o valor do FGTS depositado e não tem acesso ao programa de seguro-desemprego.
A ideia da lei trabalhista é a de que o empregado, por ter cometido falta grave assim considerada em lei, indenize o empregador, por meio da perda dos direitos indenizatórios a que teria direito se não houvesse cometido a falta grave.
FALTAS GRAVES
O artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho indica exemplos de faltas que podem ser cometidas pelo trabalhador e que autorizam o seu desligamento da empresa, por justa causa.
Em resumo, são as seguintes: ato de improbidade ou desonestidade; incontinência de conduta ou mau procedimento (que tem a ver com comportamentos inapropriados mantidos pelo trabalhador no ambiente do trabalho ou fora dele); embriaguez habitual em serviço; violação de segredo da empresa; ato de indisciplina ou de insubordinação, a exemplo de reiteradas ausências injustificadas ao trabalho ou descumprimento habitual de ordens do empregador; abandono de emprego; ato lesivo da honra ou boa fama e ofensas físicas praticadas no trabalho contra qualquer pessoa, contra o empregador ou contra o chefe imediato; prática constante de jogos de azar; perda de habilitação ou dos requisitos exigidos para exercício das funções contratadas, a exemplo de motorista profissional que perde a CNH por infrações de trânsito por ele cometidas.
Lembrando ainda que mais recentemente os tribunais têm considerado como falta grave a recusa injustificada à vacinação contra a COVID-19, ato que autoriza o desligamento do trabalhador por justa causa.
Fato é que se o empregador constatar, depois do desligamento do trabalhador, sem justa causa, o cometimento de falta grave que fosse capaz de gerar o desligamento por justa causa daquele empregado, poderá converter a dispensa sem justa causa em dispensa por justa causa.
Tal conversão, no entanto, somente será possível ser realizada no período relativo à indenização do aviso-prévio pago quando da dispensa sem justa causa. Essa indenização é devida a todo trabalhador desligado de forma imotivada e equivale a um mínimo de 30 dias de salário.
DEVOLUÇÃO DOS VALORES
A consequência prática dessa alteração na espécie do desligamento do trabalhador é que o empregador poderá cobrar do trabalhador a devolução dos valores pagos a título de verbas indenizatórias de forma indevida, já que, tendo cometido falta grave, não teria direito a receber essas verbas que, no desligamento do trabalhador, representam custo elevado para o empregador.
Para a devolução do valor, o empregador poderá ajuizar ação trabalhista contra o empregado, na Justiça do Trabalho ou, caso o empregado ajuíze ação trabalhista contra o empregador discutindo outros direitos que entenda não cumpridos, o empregador poderá apresentar uma “defesa-ataque” na mesma ação, chamada de reconvenção, a qual terá a finalidade de abater o valor pago de forma indevida a título de verbas indenizatórias de eventual valor que venha a ser reconhecido ao trabalhador em decorrência de um ou outro direito reconhecido na ação como não cumprido pelo empregador.
É de suma importância, portanto, que o empregador esteja atento a esse direito que, em regra, é desconhecido da maior parte dos empreendedores.
*Osvaldo Alencar Silva, advogado, sócio do escritório De Paula Machado