Em artigo intitulado “A visão do TST sobre o uso de celular corporativo“, o advogado e professor Fernando Borges Vieira analisa decisões recentes da mais alta corte trabalhista sobre o uso de telefone celular.
Segue o texto, na íntegra, extraído do portal Consultor Jurídico (que também pode ser acessado por meio deste link).
A visão do TST sobre o uso de celular corporativo
por Fernando Borges Vieira
Recentemente o Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão por meio da reconheceu o direito ao recebimento de horas de sobreaviso a empregado que permanecia à disposição da empresa empregadora por intermédio de telefone celular.
Apesar da Súmula 428 estabelecer que o uso do celular, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, a 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho concluiu que o empregado de fato permanecia à disposição da empresa, a qual o acionava a qualquer tempo, limitando sua liberdade de locomoção.
Bastou a publicação deste posicionamento da maior corte trabalhista do país para que novamente se trouxesse à baila vários questionamento acerca da utilização de meios telemáticos e controle de jornada.
Oportuno, pois, salientar que a utilização do aparelho celular ou qualquer outro meio telemático, a exemplo de smartphones, tablets e computadores, não implica necessariamente no exercício de trabalho e, portanto, no reconhecimento de labor extraordinário.
Como já salientamos em artigos antecedentes, o direito à percepção de hora extra, acrescida do respectivo adicional, exige a efetivação de tarefa e o controle da mesma.
Exemplifiquemos para que reste suficientemente explícito, considerando as hipóteses sobre as quais passamos a tratar.
Hipótese 1) O empregador envia uma série de mensagens ao seu empregado após seu horário de trabalho, solicitando sejam realizadas tarefas no dia seguinte. O empregado, utilizando-se de meio telemático, lê tais mensagens e, por mais que fique organizando o dia seguinte de trabalho em sua mente, nada faz. Suponhamos, ainda, que chegue a respondê-las, muito embora pudesse fazê-lo no dia seguinte.
Hipótese 2) O empregador envia uma série de mensagens ao seu empregado após seu horário de trabalho, exigindo as tarefas solicitadas sejam realizadas de imediato. O empregado, portanto, deixa seus afazeres a passa a realizas as tarefas que solicitadas lhe foram.
Na primeira hipótese não há que se pensar em jornada extraordinária, pois nenhuma atividade foi exigida pelo empregador. Mesmo que o empregado tenha decidido, exclusivamente por sua conta, responder às solicitações, não de pode compreender que houve exigência de trabalho além da jornada normal.
Já na segunda hipótese, há sim jornada extraordinária, pois o empregado recebeu a ordem de desenvolver estas tarefas além de sua jornada.
Superada esta questão e desfazendo uma primeira confusão, certo é que o posicionamento adotado pelo Tribunal Superior do Trabalho caminhou mais no sentido de reconhecer o sobreaviso e não propriamente a jornada extraordinária.
O parágrafo segundo do artigo 244 da Consolidação das Leis do Trabalho traz a definição legal do que se compreende por sobreaviso, qual seja: Considera-se de sobreaviso o empregado efetivo, que permanecer em sua própria casa, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço. Cada escala de sobreaviso será, no máximo, de 24 horas. As horas de sobreaviso, para todos os efeitos, serão contadas à razão de 1/3 do salário normal.
Assim, não basta o empregado ter um aparelho celular ou qualquer outro instrumento telemático corporativo para se caracterizar o sobreaviso, é preciso que este empregado tenha o seu direito de locomoção atingido pela real expectativa de ser acionado pela empresa.
Partamos para mais um exemplo. Uma empresa conta com uma equipe de Tecnologia da Informação que promove todo o suporte aos seus empregados. Como há trabalho realizado aos finais de semana, solicita que um dos tecnólogos fique de “plantão” em sua casa, pois pode ser convocado para solucionar eventuais panes. Este empregado não pode viajar e nem mesmo permanecer longe de seu aparelho de telefonia celular, pois vive a real expectativa de ser convocado. Indubitavelmente estamos diante de uma hipótese na qual resta caracterizado o sobreaviso.
A grande novidade é que, no caso analisado pela corte trabalhista é que o acionamento do empregado e a prestação de seus serviços se deram por meio de telefone celular, o que não altera a essência do que já se dispôs sobre a matéria.
Ocorre, introduzidas de novas tecnologias em nosso cotidiano, o empregado não é mais obrigado a permanecer em casa à espera de um chamado, pois o contato pode se dar por bips, pagers, tablets e celulares, dentre outros meios.
Já em 1995, o Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Orientação Jurisprudencial 49 da Subseção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), compreendendo que apenas o uso do bip não seria suficiente para caracterizar o regime de sobreaviso.
Em maio de 2011, tal orientação foi convertida na Súmula 428, que trata do uso de “aparelhos de intercomunicação”, incluindo-se o celular: O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de bip, pager ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.
Não importa o meio e sim o resultado. Se o empregado foi tolhido em seu direito de locomoção e vivenciou a expectativa de ser acionado, indubitavelmente resta caracterizado o sobreaviso.
Insta ratificar, não basta que o empregado possua um meio telemático corporativo para que tenha direito à percepção de horas extras ou ao adicional de sobreaviso, é preciso que exerça reais atividades laborativas por exigência do empregador ou permaneça à disposição de sorte a sofrer tolhimento de seu direito de locomoção.
Fernando Borges Vieira é sócio responsável pela área trabalhista do Manhães Moreira Advogados Associados e professor no curso de pós-graduação da FMU.