*Marcelo Lopes Jarreta
Recentemente, foi promulgada a Lei 14.647/2023, com o objetivo de proporcionar maior segurança jurídica às relações entre as entidades religiosas e os membros que trabalham em prol da instituição.
A legislação alterou o artigo 442 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) com o principal propósito de estabelecer que, em regra, presume-se legalmente a ausência de um vínculo de emprego entre entidades religiosas ou instituições de ensino vocacional e seus líderes religiosos, adeptos ou indivíduos com funções equivalentes.
Este assunto requer especial atenção das entidades que operam como organizações de cunho religioso, como igrejas, instituições educacionais religiosas, entre outras, e também dos profissionais que atuam no departamento de recursos humanos dessas organizações.
O debate em torno desse tema não é recente. Desde a lei 9.608 de 1988, que trata do serviço voluntário, surgiram dúvidas sobre a natureza da relação entre os profissionais e a entidade religiosa para a qual dedicam seu trabalho.
A modificação suscita indagações sobre a natureza das atividades desempenhadas por esses indivíduos dentro de organizações religiosas e instituições de ensino vocacional, levando em consideração a singularidade desses profissionais, cujas responsabilidades frequentemente ultrapassam os limites de um contrato de trabalho tradicional e se estendem a uma relação intrinsecamente ligada à crença e atividade religiosa.
Há duas perspectivas para compreender a mudança:
De maneira favorável, pode-se argumentar que a natureza religiosa e espiritual das atividades desempenhadas por esses ministros e membros de ordens religiosas não deve ser equiparada às relações de trabalho convencionais. As tarefas que executam frequentemente englobam elementos de fé, formação espiritual e dedicação voluntária que não se enquadram nos padrões tradicionais de um contrato de trabalho.
Apesar disso, a nova lei prevê a possibilidade de reconhecer o vínculo empregatício “em caso de desvirtuamento da finalidade religiosa e voluntária”.
Ou seja, se por um lado a Lei visa criar um ambiente jurídico mais seguro para entidades religiosas, há uma interpretação de que, caso a atuação dos profissionais contrarie a vocação religiosa e converta em uma atuação mais próxima da realidade de um funcionário comum – com horários rígidos, ordens não relacionadas à atividade religiosa, advertências, descontos salariais, contracheques, horas extras e tarefas não relacionadas ao ensino religioso, como atender telefones, pintar igrejas e dar aulas –, possa haver a caracterização do vínculo de emprego.
Lei que visa a pacificar o entendimento jurídico sobre o tema:
Com a promulgação da nova legislação, há um fortalecimento do entendimento jurisprudencial que já prevalecia.
Até então, pelo menos as 1ª, 4ª, 5ª, 6ª e 8ª Turmas do Tribunal Superior do Trabalho já haviam proferido decisões que rejeitaram a relação de emprego entre pastores e igrejas. Da mesma forma, os Tribunais Regionais do Trabalho seguem a mesma linha majoritária do TST.
Entre as cortes que já emitiram decisões desfavoráveis aos líderes religiosos que buscavam o reconhecimento do vínculo de emprego, estão TRT-1, TRT-2, TRT-3, TRT-4, TRT-7, TRT-14, TRT-15, TRT-18 e TRT-24.
Portanto, com a promulgação da lei, inicialmente espera-se uma redução das demandas judiciais sobre o assunto, embora o texto final da lei não tenha especificado quais profissionais se enquadram como membros religiosos sem vínculo e quais não.
*Marcelo Lopes Jarreta, advogado do escritório De Paula Machado