Nesta entrevista, Ulisses Tasqueti, sócio do Escritório De Paula Machado Advogados Associados, fala sobre a vacinação contra o novo coronavírus nas relações de trabalho.
– Recentemente, o STF decidiu sobre a obrigatoriedade das vacinas da Covid-19. Afinal, elas são ou não obrigatórias?
A Lei 13.979, de 2020, que fundamenta a política pública de enfrentamento à pandemia, diz que o Poder Público pode adotar a vacinação compulsória de pessoas. O STF afirma que cabe ao Ministério da Saúde decidir se a vacinação será obrigatória.
Por enquanto, o Programa Nacional de Imunizações não estabelece essa obrigatoriedade. Então, enquanto não houver outra determinação, mesmo quem esteja em grupo de risco não é obrigado a se vacinar. Mas pode haver consequências.
– Que tipo de consequências?
O empregador pode exigir, como medida de proteção à saúde no trabalho, que os empregados estejam vacinados contra Covid-19.
No caso, essa exigência só vale para quem está nos grupos prioritários ou quando as vacinas estiverem disponíveis pela rede privada de saúde. Vale, também, para quem não tenha contraindicações. Não faz sentido cobrar a vacina a quem não pode ser vacinado.
Aliás, não é de hoje que a vacinação é estimulada ou exigida nos ambientes corporativos. Entre os documentos obrigatórios para a contratação de um empregado está o atestado de vacinação, devidamente atualizado. Além disso, muitas empresas já perceberam que é mais barato subsidiar vacina de gripe para os empregados do que arcar com o custo das ausências causadas pela doença.
– E se o empregado se recusar a atender à determinação do empregador?
O empregador está amparado pela Constituição, que estabelece ser dever do empregador reduzir os riscos no ambiente de trabalho (art. 7º, inciso XXII). Se o empregador coloca como regra de saúde aos empregados se imunizarem, ele pode aplicar medidas disciplinares, como orientação, advertência, suspensão ou até dispensa por justa causa, para garantir seu cumprimento.
– O empregador é obrigado a fiscalizar ou exigir vacinação dos colaboradores?
Não exatamente. O empregador é obrigado a atender às exigências mínimas da Lei 13.979, de 2020, como fornecer máscaras e outros equipamentos de proteção individual (art. 3º-B), mas, pelo menos por enquanto, não a vacina.
Há quem compare a vacina com equipamentos de proteção, mas os EPIs têm definição legal própria (art. 166 e 167 da CLT). Além disso, como vimos, a vacina não é considerada obrigatória nem mesmo pelo Ministério da Saúde.
Não faz sentido exigir ao empregador que promova uma vacinação que o próprio Estado não considera obrigatória.
– Existem exceções?
Há duas exceções: atividades de risco e normas específicas.
Empresas que exploram atividades que criam risco acentuado para o trabalhador ser infectado pela Covid-19 são responsáveis pelos danos sofridos pelos empregados (art. 927, parágrafo único, do Código Civil).
Assim, se existe um risco acima do normal de contrair Covid-19 no trabalho, mesmo se forem respeitados os protocolos de segurança, a empresa pode futuramente ser obrigada a exigir vacinação. Além disso, nas empresas onde há maior risco de contrair Covid-19, há também maior risco de a doença ser equiparada a acidente de trabalho (Nota Técnica SEI nº 56376/2020/ME).
Essas empresas devem consultar seu setor de Medicina do Trabalho e avaliar a conveniência de exigir vacinação.
Outra exceção são as normas específicas, como leis Municipais, regulamentos profissionais, Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho. Essas normas podem criar exigências não previstas na lei (art. 154 da CLT). Já há notícias de sindicatos colocando vacinas na pauta de reivindicações, na negociação coletiva.
– E no caso de empregados de empresas terceirizadas?
Uma empresa contratante (que chamamos de “tomadora de serviços”) não tem ingerência sobre os empregados das empresas terceirizadas (que chamamos de “prestadoras de serviços”). Ou seja, a empresa terceirizada é quem deve decidir sobre vacinas e, se for o caso, fiscalizar seus empregados.
Por isso, as empresas devem renegociar os contratos, para entrar em acordo sobre a vacinação, especialmente se os terceirizados têm acesso ao estabelecimento da empresa contratante.
O ideal é que as empresas estejam alinhadas. Imagine se um empregado de terceiro, que poderia ter sido vacinado e não se vacinou, adquire Covid e a transmite para os empregados próprios que ainda não puderam se vacinar?
– O empregador é obrigado a liberar o empregado do trabalho para ir se vacinar?
Se o empregador exigir que os empregados sejam vacinados, deve liberá-lo do trabalho para isso. Caso contrário, somente há essa liberação se houver indicação médica de afastamento, por atestado.